As imagens vem aa minha mente erráticas, rápidas, deslizantes como véus. Cenas de anos de viagens, cenas de lugares longínquos, inimagináveis aas vezes. Cenas que vivi, graças a Ele e a ela, minha querida Mae.
Nao entendo bem que lógica minha mente adota para trazer aa lembrança um ou outro lugar, neste ou naquele momento. Pra que saber, afinal? Basta sentir. Sera que sao as vibrações das ferias, da cabeça solta, dos pensamentos ao vento e ao sol que evocam esse mosaico maravilhoso? Pode ser. Eh mais uma viagem. Mas sem sair do lugar, e incrivelmente fantástica.
Lembro das cores terrosas de Agra, interior da India, a caminho do Taj Mahal. Mas ha muito mais que o Taj em Agra. Eh tanta historia que nao consigo reproduzir. Fortes, fortalezas, pobreza, pobreza, pobreza. Ontem, hoje e, espero que nao, amanha. Lado a lado com a religiosidade (se bem que depois do livro que acabei de ler, de um jornalista que se faz passar por um dalit -- a menor casta indiana --, desconfio dessa religiosidade). Com as faces famintas das crianças que grudam no vidro do carro. So me passam na cabeça, como nuvens, as cores: ocre, marrom, e suas variações. Pedra, historia, pobreza, pobreza, pobreza. A metros do maior monumento ao amor, o Taj Mahal. A melhor cara da India: contradição. Tanta falta e tanta opulência. Tanto escuro e tanto branco. Tanto mistério e tanto a entender. Parto.
A próxima cena nao poderia ser tao diferente. Milhares de papeis noeis pelas ruas, alguns pelados (isso mesmo, sem roupa). Eh época de Natal e essa eh uma tradição da cidade. Em duas palavras, onde estou? Claro, San Francisco. Na democrática, maluca, íngreme e apaixonante cidade da ponte de ouro. Loucura. So olhar. E comprovar como ha seres humanos tao diversos nesta vida.
Do colorido do bairro Castro (onde se concentram os gays de SF) para o soturno shopping center de Doha, Catar. Nao ha experiencia mais engraçada (seria essa mesmo a palavra? Pensando bem, acho que nao) do que entrar numa loja de burcas. Nunca o preto se apresentou de tantas formas diferentes. Com renda, sem, tecido mais leve, menos. Mas, SEMPRE, preto. E elas andam atras deles, seus homens. Seus? A sensação que mais me acompanhou em Doha foi a vontade de um homem me deixar entrar primeiro no elevador. Ah, e também a reza chorosa das madrugadas.
E vem Genebra. A cidade da ONU, da fonte que, magnânima, se coloca no centro do lago que da nome aa cidade. Pequena, fácil, acolhedora. Fui três vezes e já me senti em casa. Lembro da vendedora da deliciosa loja de chocolates que tem amigos brasileiros, sabe da nossa política e me da uma caneta para me lembrar dela, alem de desconto no chaveiro que hoje olho todo dia quando ligo meu carro. Genebra. Onde as Nacoes Unidas tentam fazer com que o mundo seja um lugar mais habitável. Cidade da enorme cadeira com um dos pés quebrado, para que nao nos esqueçamos das tragédias provocadas pelas minas terrestres.
E, como nao, vou sem escalas para o lugar que, segundo dizem, so se eh homem / mulher de verdade quando se alcança seu topo. Elas, as Muralhas. Da China. Como uma imensa serpente a percorrer Pequim. Milhares de chineses com suas sombrinhas e eu ali, com dor no pe, fazendo o possível para me tornar uma Mulher. Subindo. Olhando, degustando, agradecendo (meu sonho era conhecer essa Maravilha da Natureza). Mas me sinto um pouco ludibriada. Preciso voltar, em uma parte menos turística. China. Das buzinas e do cinza. Dos sabores tao diferentes e do fuso horario matador. Que dia eh hoje mesmo?...
A neve cobre todos os carros e a pequena rua, vejo de madrugada da janela do lindo hotelzinho sustentável no centro de Kopenhagen. La fora, a conferencia das Nacoes Unidas que pretendia um acordo climático histórico. Era 2009. E seguimos em busca dele. Mas a cidade eh bonita demais. Com um parque cheio de luzes e uma sobremesa inesquecível.
E o que dizer de Salt Lake City, encravada em Utah, cidade dos mormons? Sabe como eh, Estados Unidos sao sempre Estados Unidos. Uma historia aa parte, como se o mundo girasse em torno deles. Mas sao maravilhosas as montanhas cheias de neve. A hospedaria onde tomamos uma sopa, a caminho de uma das três reuniões do dia, me remeteu diretamente para um daqueles filmes com cabanas montanhesas que a gente jura que nao existem de tao bacanas (cabanas bacanas, bacanas cabanas. Nossa Língua Portuguesa nao eh o máximo?). Existem. Elas e os montanheses, com seus esquis. Foi la que assisti pela primeira vez o Quebra-Nozes. Ou tera sido em Sacramento?... A memória já nao eh mais a mesma.
O lugar mais lindo que ja visitei: Cape Town. Este pedacinho especial da Africa do Sul mereceu uma crônica so pra ele. E cada linha do texto era envolvida pela alegria tao brasileira dos africanos. Ou sera o contrario?
Tantas cenas ainda a percorrer... Chicago, com seus arranha-ceus e mafiosos aa espreita, tenho certeza. Washington, carregada de patriotismo e seus museus, especialmente o museu da noticia, Newsmuseum, sonho de qualquer jornalista. A soturna e pesada Varsóvia. A longínqua Taiwan. A inacreditável e caótica Roma. As eternas Nova York, Londres e Paris. A primeira, Boston. Seguida de Minneapolis, Charlotte, Texas.
E, como nao, Berlim. Onde me perdi ha 25 anos, indo parar no lado oriental em pleno 1990 ("Quero flores", eh a crônica dessa experiência). Retornar a Berlim duas vezes, uma delas para palestrar na Universidade de Humboldt, foi um presente. Passei nos mesmos lugares, evoquei os sentimentos daquela mochileira sedenta de conhecer, viver. No coração, a mesma certeza: de que so se vive uma vez (por vez). Que a alma segue nossos passos. Que nao ha caminho errado ("E se eu pegar o trem errado?", perguntou uma assustada Sonia de 20 e poucos anos ao amigo inglês do meu irmão. A resposta, de tao obvia e límpida, virou uma máxima pra mim: "Você desce e pega o trem certo").
Sempre podemos parar e descer. Sempre. Pode ser que a viagem atrase um pouco, mas você achara o rumo. Simples assim. Nao ha problema sem solução, nao ha encruzilhada sem reta. Basta seguir. Mundo afora. Uma vidente disse aa minha mae, quando ainda éramos pequenos: "Você tera um filho que viajara o mundo". Acho que sou eu. Pode ser também o Luiz, a Mari, que importa? Os videntes, mesmo sem razão tem sempre razão. Porque nos ajudam a sonhar. Assim como os lugares, as cenas, as viagens. E de tudo fica apenas uma palavra: OBRIGADA.
ps- sem cedilhas e acentos, ainda
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015
To no jogo
Eh isso. Tres palavras que fazem toda a diferença. Ditas desta forma, pra gringo ter duvida em aula de português, assim como a gente sofre para entender as gírias que eles falam mesmo depois de estudarmos anos o idioma e acharmos que entendemos tudo de inglês...
Pode ser que nao se esteja com as melhores cartas, nem na noite mais inspirada. Mas estar no jogo eh o que vale. Da tempo de pensar, de repensar, de tentar uma nova jogada, de recuar e ate mesmo de deixar passar uma mao. Avaliar novas estratégias, tentar ler a face dos adversários, fazer uma prece ao deus das cartas. Estar no jogo, continuar no jogo. Jogando. E, como diria a pimentinha, "...aprendendo a jogar".
Ha momentos mais animadores, em que temos a certeza de que vamos ganhar. "Chegou minha vez", grita a alma calejada de dor. "Quase", responde um ser maior que por tudo zela. Um dia ouvi que nesta vida estamos apenas vendo uma pagina e nao o livro todo de nossa existência, e por isso eh tao difícil entendermos algumas situações. Pode ser. Isso me consola. Porque, afinal, os livros sempre acabam em finais felizes. Ou nao?
Enfim, que venha a próxima mao. Nesta certamente terei mais sorte, afinal, to no jogo. Deve ter algum desígnio divino nisso, senão já teria ido pra casa. Ah, eh ela, a sorte, que me faz ficar. Ela, as vezes tao mal interpretada. "Nao vale a sorte, eh preciso ter talento, competência...", diriam os gurus empresariais. E SORTE, acrescento eu. Estar no lugar certo, na hora certa, e dizer as coisas certas. Se isso nao eh sorte, eh a mao de Deus. Que, no fim, devem ser parentes próximas.
Analiso minhas cartas, olho o relógio, pondero. Tudo ou nada? All in? Por que nao? O que se tem a perder? Sim, tem-se a perder, claro. Mas também a ganhar. Outra frase que me acompanha desde adolescente eh: "So se arrependa do que você nao fez, nunca daquilo que fez". Entao, que seja. All in.
...
Perdi. Mas, veja bem, perdi essa partida. Nao as próximas, nao o jogo da vida. Pensando bem, essa derrota certamente me ensinou algo. Serei mais prudente na próxima (ou nao, aas favas a prudência, parente muito próxima da chatice). Certamente na próxima....
E assim se segue. Nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas... aprendendo a jogar....
ps: sigo sem acentos e cedilhas.
Pode ser que nao se esteja com as melhores cartas, nem na noite mais inspirada. Mas estar no jogo eh o que vale. Da tempo de pensar, de repensar, de tentar uma nova jogada, de recuar e ate mesmo de deixar passar uma mao. Avaliar novas estratégias, tentar ler a face dos adversários, fazer uma prece ao deus das cartas. Estar no jogo, continuar no jogo. Jogando. E, como diria a pimentinha, "...aprendendo a jogar".
Ha momentos mais animadores, em que temos a certeza de que vamos ganhar. "Chegou minha vez", grita a alma calejada de dor. "Quase", responde um ser maior que por tudo zela. Um dia ouvi que nesta vida estamos apenas vendo uma pagina e nao o livro todo de nossa existência, e por isso eh tao difícil entendermos algumas situações. Pode ser. Isso me consola. Porque, afinal, os livros sempre acabam em finais felizes. Ou nao?
Enfim, que venha a próxima mao. Nesta certamente terei mais sorte, afinal, to no jogo. Deve ter algum desígnio divino nisso, senão já teria ido pra casa. Ah, eh ela, a sorte, que me faz ficar. Ela, as vezes tao mal interpretada. "Nao vale a sorte, eh preciso ter talento, competência...", diriam os gurus empresariais. E SORTE, acrescento eu. Estar no lugar certo, na hora certa, e dizer as coisas certas. Se isso nao eh sorte, eh a mao de Deus. Que, no fim, devem ser parentes próximas.
Analiso minhas cartas, olho o relógio, pondero. Tudo ou nada? All in? Por que nao? O que se tem a perder? Sim, tem-se a perder, claro. Mas também a ganhar. Outra frase que me acompanha desde adolescente eh: "So se arrependa do que você nao fez, nunca daquilo que fez". Entao, que seja. All in.
...
Perdi. Mas, veja bem, perdi essa partida. Nao as próximas, nao o jogo da vida. Pensando bem, essa derrota certamente me ensinou algo. Serei mais prudente na próxima (ou nao, aas favas a prudência, parente muito próxima da chatice). Certamente na próxima....
E assim se segue. Nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas... aprendendo a jogar....
ps: sigo sem acentos e cedilhas.
terça-feira, 24 de fevereiro de 2015
Exercício de paciencia
O lugar eh lindo. Uma ilha. Que me leva a pensar nos descobridores de nossa terra nos idos de 1500. Mas eh também dolorosa. "Leva repelente", eh o que mais ouvi quando disse qual seria o destino dessas minhas ferias. Ok, entendi. Ok, vou levar. Ok, ok. Nada ok. Uma Ilha Bela, mas também surpreendentemente dolorosa. O choque de realidade veio no primeiro cafe da manha. Com minúsculos insetos a roubar o prazer do primeiro dia. A incomodar, irritar, desesperar ate. O que fazer? Nada. Não ha controle sobre o inesperado. Mesmo passando repelente. As vezes a vida não aceita repelentes. E machuca.
Mas logo vem o ser humano -- ah, o ser humano... -- a se adaptar. Descubro que hora do dia atacam mais, recebo mil e uma dicas no melhor estilo zapzap/facebook. E sigo. Dias afora, vida afora. Como na bela canção: "Não vou dizer que não dói... mas já senti tantas dores...".
E entra em cena ela, a paciência. Que se ha de fazer? Eles estão por aqui, invisíveis, dominadores. Me rendo. Não sem luta. Mas percebo, assim como na vida, que ha momentos para recuar, esperar. E -- surpresa -- descobre-se muitas vezes sentimentos e sentidos escondidos nessa rendição. Um autocontrole, talvez. Um coração disparado pela dor, que tem algo de poético.
E entram em cena, também, eles, os amigos e parentes solidários. Porque o ser humano -- ah, o ser humano... -- sempre se une na dificuldade. A Gabi que traz o milagroso repelente caseiro de cravo (obrigada!!), a Re, Dri e Marlene que me indicam tipos de repelente e os demais, que 'curtiram' meu sofrimento cômico. E a Vanessa, prima querida, que reaparece na magia desse mundo virtual. E o delicioso paradoxo: "NAO coce, so piora" e "A única parte boa eh cocar". Como boa exemplar da raca humana -- ah, o ser humano... -- oscilo entre os dois, ao sabor do momento, do vento, do humor, do sabor.
Mas tudo passa. Certamente passa. Deixando, no entanto, pelo caminho seus rastros de destruição e construção (dicotomia da humanidade). Assim como os descobridores de nossa terra. Que em meio a tanto mar, mata virgem e imensidão, catequizaram os índios, fazendo-os acreditar que seus pages eram enviados do mal, que sua nudez era um atentado e que suas danças e ritos eram infantis. Mas ca estou, centenas de anos depois, em um resort numa ilha bela, fruto, por que não, dessa colonização. Conforto, piscina, mar, massagens, gastronomia, travesseiros e ar condicionado. Ah, e os borrachudos. Para não me fazer esquecer que nunca temos o controle de tudo.
ps1: não temos controle nem do teclado do computador. Desculpem a ausência de acentos e cedilhas.
ps2: não temos controle do teclado nem da internet. Depois de escrever toda a crônica a perdi. Determinada -- como o são os borrachudos --, escrevi de novo. Perdi partes que tanto tinha gostado. Mas escrevi outras novas. E cheguei ao final. Porque eh como dizem: tudo da certo no fim. Se não deu, eh porque ainda não chegou ao fim.
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