terça-feira, 22 de janeiro de 2013

No dorso da mão - Janeiro de 2013


Outro dia, no meio de um momento perdido da tarde, olhei para o dorso da minha mão e vi um pequeno machucado que já começava a cicatrizar.

Estranhei a pequena marca ali, há quantos dias, será? Não percebi nada, não senti nenhum arranhão, esbarrão, corte, nada. E ela já estava ali, há quanto tempo, meu Deus? Foi um sentimento engraçado, de invasão. Algo havia acontecido comigo, eu não tinha notado, e o machucado já começava até a cicatrizar.

Pus-me a pensar em quantas feridas não físicas vamos tendo pela vida que não percebemos. É uma tristeza aqui, uma pequena decepção ali, um sonho não realizado acolá, que talvez nem percebamos como dores de fato. Talvez pela crueza da vida, pela necessidade de correr-correr-correr sempre mais-mais-mais... Quem sabe?

E assim a gente vai tocando, e as feridas não notadas vão cicatrizando. Acho que assim como minha mão deu conta de tratar o pequeno ferimento ao qual minha razão não deu atenção, nossas proteções psicológicas vão colocando escudos emocionais em torno desses fatos.

Mas fico também a pensar que feridas não bem cicatrizadas podem reabrir (na verdade, até as cicatrizadas correm esse risco...). Podem querer reviver, cobrar o quinhão de olhar que renegamos no passado. Será que dói mais? Ou será que percebendo a dor desde o início a cicatrização é mais duradoura? Não sei.

Mas sei que somos assim, corpo e alma, matéria e espírito, dores materiais e emocionais. E alegrias também. Talvez eu estivesse tão bem naquela semana que o pequeno machucado do dorso da mão não se fez notar. Talvez uma alegria compense uma dor, uma perda, uma frustração, uma decepção. Não sei.

Talvez a compensação seja momentânea, talvez o momentâneo seja tão realizador que se estenda por mais do que o tempo que podemos contar em uma vida. Não sei.

Mas sei, ou acho que sei, que a vida é isso. Amores, dores, alegrias, lágrimas. Ferimentos reais, imaginários, notados, cicatrizados.

E sei, aprendi, que tudo passa. Como disse Rubem Braga, nos idos de 1952, em “A borboleta amarela”, “...no fim todos passam e tudo passa; o fim é um grande sossego e um imenso perdão”.