sábado, 6 de abril de 2013

De tensões, frustrações e borboletas - 6/7/2009


De tudo que tenho lido sobre sustentabilidade, um dos assuntos mais constantes é o perfil do profissional que se dedica a este tema nas empresas. É possível elencar uma série de características, a partir de estudos, pesquisas, consultorias, artigos como este. Mas qualquer lista certamente será incompleta, e até certo ponto desanimadora.

Vamos fazer um exercício? Visão estratégica e integrada, flexibilidade, empatia, conhecimento do negócio, capacidade de influência e negociação, dinamismo, bom relacionamento, humildade, versatilidade, empreendedorismo, paixão pela causa, liderança, criatividade, obstinação... ufa! Quase um super-homem ou uma super-mulher.

Para dar minha contribuição ao tema, focarei em duas competências que julgo essenciais a partir da minha vivência diária no tema.

Gerador de tensão. O nome não é bonito nem melódico, mas retrata bem como vejo a evolução desta agenda. A construção da cultura e prática de sustentabilidade nas empresas, seja qual for seu histórico com o tema, se dá por movimentos de tensão.

Estamos sempre lidando com o que falta, com o que “deveria ser”, com “um pouco mais”. Afinal, a agenda da sustentabilidade é a agenda de uma nova gestão necessária a um novo mundo que se tornou, mais do que urgente, a única possibilidade de sobrevivência no longo prazo.

É a agenda do futuro. E não se constrói o futuro sem conflitos, sem tensão. É o movimento. A cada tensão superada, evoluímos um pouco. É o executivo que, antes tão cético, começa a abrir espaço na sua estratégia – e consequentemente na sua mente – para o tema. É aquela área que conseguiu achar seu caminho para inserir aspectos socioambientais no produto ou serviço.

Neste momento, tudo o que foi vivido durante o processo, vale a pena. É disso que vivemos. É isso o que nos alimenta e nos dá força na caminhada. Por isso, ser um “gerador de tensão” me parece uma boa definição para o profissional de sustentabilidade. Definição que, obviamente, carrega consigo as competências necessárias para se exercer bem este papel.

Uma dessas competências para mim é crucial e assim chego na segunda característica que quero destacar: resistência a frustração. A linha de raciocínio aqui é a mesma: gerar tensão, lidar com um assunto ainda não de domínio de todos, um assunto ainda em cheque e carecendo de entendimento e provas, não é algo simples.

Quantitativamente, ainda perdemos mais do que ganhamos. E o ser humano não gosta de perder. É difícil lidar com o “não”, com disputas de espaço (ser área transversal lida com isso cotidianamente), com propostas não entendidas e rejeitadas. Se fôssemos americanos, e não brasileiros, seria mais simples. A separação lá na terra do Tio Sam entre o profissional e o pessoal é bem clara. Aqui, não. Nos misturamos o tempo todo, as pessoas físicas e jurídicas, e todos os sentimentos inerentes a elas.

Mas há que se separar.Necessariamente temos que separar. A rejeição a uma proposta não significa a rejeição ao profissional e à sua competência. Vendo dessa forma, fica mais fácil de lidar.

Arrisco-me a dizer que a frustração a um projeto ou ideia no campo da sustentabilidade tem um peso maior do que uma proposta do “business as usual”. Falo isso como quem gerenciou as duas agendas simultaneamente em duas organizações. Aqui, há o peso da causa.

Não gosto da conotação que a palavra “militância” ganhou ao longo dos anos, mas acho que ela define bem o que quero expressar. Os profissionais de sustentabilidade são também conduzidos por uma militância à causa. Trabalhamos por um mundo melhor. No fim do dia, é isso. Por isso, o “não” nos pesa como a negação, não só a uma proposta, mas a um mundo que inequivocadamente precisamos construir.

Neste sentido, saber lidar com a frustração se torna um bem precioso. O gestor de uma equipe de sustentabilidade tem que ter isso na veia. Para si, sem dúvida, mas principalmente para liderar uma equipe com menos experiência de vida e jogo de cintura.

Bem sabemos que para enfrentar algumas situações adversas não há bula nem manual de instrução. Quem nos socorre nesta hora é mesmo a vida, a estrada, o caminho que nos deu aqueles calos tão preciosos e fez com que esses momentos possam ser conduzidos de forma mais tranquila e construtiva – não sem tristeza, sem dúvida.

Chego a este ponto com uma reflexão: estarei sendo muito amarga ao falar apenas de tensão e frustração em um artigo sobre o perfil de um profissional tão valioso nos nossos dias? Espero que não tenha soado assim.

Afinal, só conseguimos ver as borboletas, que são belas e inspiradoras, depois que elas saem de seus casulos, onde viveram processos dolorosos de evolução. O caminho da sustentabilidade é assim, belo, inspirador, transformador. Feito de degraus muitas vezes difíceis de serem subidos. Mas esta é justamente a beleza de se atuar nesta área.

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