quarta-feira, 31 de dezembro de 2014
Um dia (extra) Ordinário
Dia ordinário porque é uma quarta-feira. Meio de semana, seria meu rodízio, inclusive. Seria porque o dia é também extraordinário, e não tem rodízio. Hoje é 31 de dezembro. Último dia do ano, fim de um ciclo; quer queiramos ou não, quer sejamos supersticiosos ou não. Todo dia 31 de dezembro procuro fazer as coisas de que gosto, encerrar o ano com um dia em que repito rituais, me dou pequenos presentes. E hoje não seria diferente...
PAI NOSSO
Que estás no céu, mas, principalmente, dentro de nós. Começar este dia com a oração que o Senhor nos ensinou é mandatório. Rezei assim, numa janela, olhando para a calmaria que é São Paulo nesta época do ano, com vento no rosto e pensamento no que foi, no que será. Agradeci pelo ano, pela saúde restaurada, pelos amigos, pelas vitórias, pelas derrotas, dificuldades, tristezas e sorrisos. E agradeci também pelo que virá, num “agradecimento pré-datado”. Porque sei que seguirei sendo abençoada em 2015.
BOM DIA BRASIL
Jornalista assiste noticiário até no último dia do ano. No lugar das notícias sobre propinas, impostos novos e quetais, a condição das estradas, a preparação em Copacabana, a largada da São Silvestre, o sol escaldante iluminando rostos e corpos Brasil afora. Que seja. As más notícias continuam ali, e virão com força amanhã, bem sabemos. Mas hoje, ao menos, podemos nos dar ao luxo de assistir um pouco de amenidades.
POSTS NO FACEBOOK
“Você criou um monstro”, disse Arthur pra minha irmã, que me incentivou a entrar no Facebook este ano. Presentão. Pessoas queridas de longe se tornam íntimas. Você descobre preferências, talentos, sensibilidades. Fica mais amigo, ou amigo, compartilha, curte. No fim, cada post é pra mim como se fosse uma matéria – como tantas que escrevi –, pedaços da minha história colocados ali. É bom quando a gente muda de opinião – "Eu nunca vou entrar no Facebook”, era o que eu dizia –, revê conceitos, aprende coisas novas, se deixa levar.
CAFÉ, QUEIJO, IOGURTE
O último café da manhã do ano não podia fugir à regra. Cafezinho quente, queijo branco, iogurte. Muita proteína, alimentos saudáveis, gostosos. Faz bem pro corpo e pra alma.
CANDY CRUSH
Sim, joguei de manhã. Vai que passo daquela fase... Uma meia hora aqui, outra ali, o famoso joguinho se tornou um companheiro esse ano. Foram muitos momentos de relaxamento, desafio, exercício mental, nada. Porque fazer nada às vezes é o melhor remédio.
SÃO SILVESTRE
Preferia quando a corrida era à meia noite. Sempre assistíamos brindando o novo ano, na praia. Naquela época de adolescente eu pensava: “Um dia vou correr a São Silvestre”. Mudou o horário, perdeu o encanto. Como tantas coisas na vida que, de repente – ou nem tanto – perdem o porquê, a cor, a forma. Se diluem no espaço. Eram. Não são mais. Mas ainda gosto de assistir, ao menos a largada. É uma festa. Festa paulistana.
TRILHA SONORA
Antes de sair, escolho os CDs que quero ouvir hoje. Chorão (quem diria, eu tão MPB...), Milton, Ana Carolina, Oswaldo Montenegro e por aí vai...
VOLTA PELO OUTRO LADO
Meu carro estava estacionado num outro lugar, o que me fez sair de casa por um caminho diferente dos outros 300 e poucos dias. Peguei o mesmo farol, mas vindo do lado oposto, vendo por outro ângulo. Gostei. Impossível não pensar que olhar de uma perspectiva nova pode abrir muitas janelas. Incomoda, a princípio. Tira da zona de conforto; é como uma roupa ainda não moldada ao corpo. Mas é só usar um pouco mais...
ELE, O PARQUE
Sempre que estou em São Paulo no Ano Novo, vou ao Parque do Ibirapuera no dia 31. O Parque faz parte da minha história. Meu pai me deixava lá nos domingos de manhã, quando eu ainda não tinha 18 anos, e me pegava na volta da Missa. Em outra época, eu ia de manhã, porque trabalhava como professora apenas no período da tarde. Foi lá que chorei algumas vezes, indecisa sobre continuar a trabalhar em rádio ou partir para o mundo empresarial. Ou quando me senti só, mais de uma vez. No Parque, participei de corridas de rua, joguei várias partidas de vôlei, andei, andei, andei, corri, corri, corri. Como hoje. E o melhor: com a dádiva de um parque relativamente vazio, com lugar fácil pra estacionar. São Paulo podia ser sempre assim...
ELA, A AVENIDA
A volta do Parque para casa poderia ser pela 23 de Maio ou pela Avenida Ibirapuera. Sem dúvidas. Sair do dia a dia, ir pela Ibirapuera. Volto no tempo. Morávamos ali, onde hoje é o Shopping Ibirapuera. Estudávamos ali, onde hoje é um cartório. Mamãe ia nos buscar na escola. Parávamos no supermercado, hoje o Pão de Açúcar, comíamos um pãozinho quente e íamos pra casa esperar o papai para uma deliciosa sopa de lentilhas. Foi lá que casei, na Nossa Senhora da Esperança, a igreja de lustres redondos a cair do teto. É lá, foi lá, será sempre por lá.
CAFÉ, CLARO
Não podia acabar o ano sem um café com espuminha na Kopenhagen. Clássico. Companheiro do ano em tantos sábados. Ambiente gostoso, que lembra também a infância e as balas de leite, preferidas da mamãe. Quer dizer, preferidas depois do bombom Cherry Brandy. Mas esse era – e é! – muito caro para comprar sempre. Pensando bem... que bom que não comprávamos sempre porque assim dávamos valor às ocasiões em que era possível. Obrigada Mãe e Pai, por mais este aprendizado.
VEREADOR JOSÉ DINIZ
Uma passada no papai antes de voltar pra casa de vez. O mesmo caminho, a mesma casa, família. Porto seguro, parte da identidade, família.
Ainda são apenas 15h. Faltam ainda nove para o Ano Novo. Mas vou encerrando esta crônica aqui. Nove horas ainda em que provavelmente verei televisão, lerei, postarei, cochilarei, me prepararei para receber 2015. Coisas banais, triviais. Coisas deliciosas, pequenos prazeres. Encerrarei o ano feliz com meu dia 31. Entrarei 2015 chorando ao ver os fogos, festejando um novo período que se inicia. Que venha carregado do que já tive em 2014: oportunidades, amigos, amor, desafios, trabalho, lazer, família, saúde, sonhos. Amém.
domingo, 1 de junho de 2014
Saudade - 01/06/2014
“Saudade mata a gente, saudade mata a gente menina...” Sempre Djavan.
Saudade, palavra que só existe na língua portuguesa, dizem. Dizem. Com a modéstia e o rebolado que são típicos da nossa terrinha. Mas isso não importa muito. Saudade mata a gente. Em qualquer língua, tenho certeza.
Nem sempre nos damos conta das saudades que moram no nosso coração. Afinal, a vida. A cobrar a hora de acordar, de dormir, de comer, de dizer ‘te amo’. E vamos indo, vivendo, correndo, trabalhando, amando, chorando, correndo, vivendo, indo.
Mas hoje, além de confirmar que saudade mata a gente, descobri que existem vários tipos diferentes de saudade -- só pra complicar a explicação do termo pra quem está aprendendo português.
Voltei no tempo nas duas últimas semanas. Após resistir bravamente a entrar no facebook (obrigada Mari por mais este presente de aniversário), me rendi a ele. E me alimentei de amor e carinho. E senti saudades. Saudades que certamente estavam no meu coração esperando só a oportunidade de cobrar sua atenção.
Saudades de quem tá perto (Luiza, Te) e de quem tá longe (Re). Saudades de quem saiu lá do túnel do tempo (Lecinha) e de quem está sempre por perto (Mari). Saudades de mim, com elas. Saudades de tempos que se foram, saudades de tempos que virão.
Dizem que a vida é muito curta – e é. Descobrimos isso da mais dura forma. Quando aquela pessoa querida se vai, seja morrendo, seja saindo de nossas vidas – um outro tipo de morte. E aí parece que um sentimento de urgência nos toma. Urgência em viver, urgência em falar, em tocar. Urgência inundada de dor, inundada de saudades. Saudade mata a gente.
Como é que se mata a saudade que mata a gente? Quem morre primeiro?
Saudades do namorado da adolescência; saudades do amor maduro; saudades do afago de mãe (Mãe, as saudades de você são indescritíveis); saudades das brincadeiras na piscina (com ou sem água – lembram meninas?) ou no porão; saudades das tardes na praia (Grande ou Santos); dos sorvetes no interior (Birigui, Bebedouro); saudades do almoço de domingo no Nono, roubando salgadinho do armário antes da comida ser servida (era uma delícia né Lu?); saudades das visitas à Tia Ne no domingo, enquanto a Re se arrumava pra sair.
Saudades, saudades, saudades... Já dizia Djavan.
Mas um tipo de saudade podemos minimamente tentar controlar. As saudades que sentiremos daqui a alguns anos. Continuaremos, claro, a sentir saudades de momentos bons (e também ruins) da infância, adolescência, maturidade, mas acrescentaremos saudades de novos momentos que viveremos.
Então, daqui a uns anos quero sentir saudades (boas) do(s) tempo(s) que passei com a Re no Canadá e das longas conversas que tivemos; dos shows que fui com a Mari e a Te; do reencontro com a Lecinha em Campinas e das várias idas nossas pra lá e vindas dela pra cá que tivemos depois disso; dos cinemas, sorvetes e cafés em tardes de sábado com a Luizinha e sua Marina linda.
Quero sentir saudades dos reencontros, encontros, descobertas, entregas.
Porque a vida é curta. E saudade mata a gente.
domingo, 25 de maio de 2014
Diario dos tempos modernos - 25/05/2014
Quando menina escrevia diário. Era meu território, meu confidente, meu amigo. Havia várias versões, inclusive com chave. Eu nunca fui tão longe, mas todos sabiam que era sagrado, afinal, diário é diário. As páginas em branco devem ter sido meu primeiro exercício de jornal. Anos e anos antes de um computador. Páginas, apenas. Sendo preenchidas por escritos a mão, apenas e simplesmente.
Com o passar do tempo, viraram agendas, com frases e pensamentos, onde colava aquele ticket do show, do teatro, aquela letra especial que ficou no guardanapo. Tudo ali, colado, registrando os anos mais esperançosos, os anos de adolescente, quase adulta.
Eu tinha também duas outras modalidades de diário. Uma em que registrava as respostas de amigos e parentes para as mesmas perguntas -- já era um exercício de reportagem? -- e outra em que os amigos deixavam mensagens, provavelmente um ancestral dos posts, msms, whatsapp e por aí vai.
Hoje tudo parece mais rápido. Será que as meninas fazem diários? Será que os trancam a sete chaves? Tudo é tão exposto, em segundos todos seus amigos -- ou nem tanto -- lerão sua última postagem, darão likes ou não, comentarão, ou não. A internet, o face, twitter --quais mais, mesmo? -- são nossos novos diários? Não sei.
Gostei de escrever sobre meus dias de férias, conversar com as pessoas, compartilhar meus momentos. Mas gostei tanto quanto de registrar pra mim, algo que eu possa a qualquer momento reler e relembrar. Mantenho uma espécie de diário, caderno de anotações mesmo, adoro o cheiro do papel. Mas gostei do face, com limites nas entregas, nos amigos, mas gostei.
E nesta reflexão sobre diários lembro a emoção de ler o diário de minha mãe, que ela me deu. Incrível. Ler sobre os sonhos juvenis da minha mãe, das inseguranças, dúvidas, frustrações, alegrias.
É, escrever, registrar, digitar, postar, seja lá o verbo que utilizemos, certamente é algo da psicologia humana, de querer se eternizar, quem sabe?
Sei que o sentimento após escrever se assemelha a uma missão cumprida, com gosto e regalo. E reler, depois, mostra que temos tantos lados a descobrir que ficam mais claros quando colocados pra fora. E, por que não, compartilhados.
Com o passar do tempo, viraram agendas, com frases e pensamentos, onde colava aquele ticket do show, do teatro, aquela letra especial que ficou no guardanapo. Tudo ali, colado, registrando os anos mais esperançosos, os anos de adolescente, quase adulta.
Eu tinha também duas outras modalidades de diário. Uma em que registrava as respostas de amigos e parentes para as mesmas perguntas -- já era um exercício de reportagem? -- e outra em que os amigos deixavam mensagens, provavelmente um ancestral dos posts, msms, whatsapp e por aí vai.
Hoje tudo parece mais rápido. Será que as meninas fazem diários? Será que os trancam a sete chaves? Tudo é tão exposto, em segundos todos seus amigos -- ou nem tanto -- lerão sua última postagem, darão likes ou não, comentarão, ou não. A internet, o face, twitter --quais mais, mesmo? -- são nossos novos diários? Não sei.
Gostei de escrever sobre meus dias de férias, conversar com as pessoas, compartilhar meus momentos. Mas gostei tanto quanto de registrar pra mim, algo que eu possa a qualquer momento reler e relembrar. Mantenho uma espécie de diário, caderno de anotações mesmo, adoro o cheiro do papel. Mas gostei do face, com limites nas entregas, nos amigos, mas gostei.
E nesta reflexão sobre diários lembro a emoção de ler o diário de minha mãe, que ela me deu. Incrível. Ler sobre os sonhos juvenis da minha mãe, das inseguranças, dúvidas, frustrações, alegrias.
É, escrever, registrar, digitar, postar, seja lá o verbo que utilizemos, certamente é algo da psicologia humana, de querer se eternizar, quem sabe?
Sei que o sentimento após escrever se assemelha a uma missão cumprida, com gosto e regalo. E reler, depois, mostra que temos tantos lados a descobrir que ficam mais claros quando colocados pra fora. E, por que não, compartilhados.
sexta-feira, 23 de maio de 2014
Chove, onde antes fazia sol - 23/05/2014
Chove. Onde antes fazia sol, muito sol. Pausa para parar. Redundante? Talvez. A vida, afinal, não é feita de redundâncias? Aqui, numa praia calma, no meio de maio, onde só se deve agradecer, a mulher pergunta ao humilde garçom no delicioso café da manhã: "Hoje as frutas virão com formigas?" Como assim? Ao diabo as formigas. O homem, ao seu lado, mudo. Talvez a vida inteira, talvez já tenha desistido de argumentar, como saber?
E eu aqui,calmamente tentando escrever uma crônica pelo celular - cade meu lap top? Longe. Vale improvisar, quem sabe fique até melhor?
Chove. Talvez porque tenha feito muito sol. Tenha nos inundado de vida. E agora dá uma trégua. Para ler, pensar, caminhar, escrever. E postar. As redes nos aproximam de amigos e parentes queridos. Nossa, décadas sem se ver, sem se falar... Você está bem? Que bom! As redes nos aproximam, tudo tão rápido... E assustam. Quem é você que curtiu o que escrevi? Que quer ser meu amigo? Como assim? Amizade não requer contato, olho no olho, mão na mão? Talvez não mais. Talvez ainda.
Chove. Um pouco menos agora. O céu começa a abrir, o sol parece querer retomar seu lugar de honra. Já? Que bom, bem-vindo, sempre. Ainda distante, apenas mandando sinais, como as longínquas mensagens que surgem no meu blog. Mensagens do Canadá (Re, obrigada por sempre me incentivar), de Campinas (é Campinas, né Lecia?...), de São Paulo, a velha doente e adorada São Paulo (meu irmão, sempre atento; Mari, responsável por eu entrar no Facebook, um novo jeito de fazer um book, afinal; Luiza e Te, primas queridas; Marcia, Ligia, Felipe, parceiros na paixão pelo voleibol), pessoas queridas que pararam para ler meus pensamentos em crônicas. Delícia.
Não chove mais. Mas está encoberto. Que bom, o céu cinza inspira o sono, a saudade, o sem-pressa. Peço mais um café, com espuminha. Lembro da espuma do mar, da onda que caprichosamente beijava as pernas da menina sonhadora de 15 anos. Amanhã, acho que amanhã dará praia. Sempre tem um amanhã, mesmo que demore 25 ou 31 anos.
E eu aqui,calmamente tentando escrever uma crônica pelo celular - cade meu lap top? Longe. Vale improvisar, quem sabe fique até melhor?
Chove. Talvez porque tenha feito muito sol. Tenha nos inundado de vida. E agora dá uma trégua. Para ler, pensar, caminhar, escrever. E postar. As redes nos aproximam de amigos e parentes queridos. Nossa, décadas sem se ver, sem se falar... Você está bem? Que bom! As redes nos aproximam, tudo tão rápido... E assustam. Quem é você que curtiu o que escrevi? Que quer ser meu amigo? Como assim? Amizade não requer contato, olho no olho, mão na mão? Talvez não mais. Talvez ainda.
Chove. Um pouco menos agora. O céu começa a abrir, o sol parece querer retomar seu lugar de honra. Já? Que bom, bem-vindo, sempre. Ainda distante, apenas mandando sinais, como as longínquas mensagens que surgem no meu blog. Mensagens do Canadá (Re, obrigada por sempre me incentivar), de Campinas (é Campinas, né Lecia?...), de São Paulo, a velha doente e adorada São Paulo (meu irmão, sempre atento; Mari, responsável por eu entrar no Facebook, um novo jeito de fazer um book, afinal; Luiza e Te, primas queridas; Marcia, Ligia, Felipe, parceiros na paixão pelo voleibol), pessoas queridas que pararam para ler meus pensamentos em crônicas. Delícia.
Não chove mais. Mas está encoberto. Que bom, o céu cinza inspira o sono, a saudade, o sem-pressa. Peço mais um café, com espuminha. Lembro da espuma do mar, da onda que caprichosamente beijava as pernas da menina sonhadora de 15 anos. Amanhã, acho que amanhã dará praia. Sempre tem um amanhã, mesmo que demore 25 ou 31 anos.
quarta-feira, 21 de maio de 2014
Pegadas na areia (as minhas) – 21/05/2014
É difícil andar na areia fofa da praia. O pé afunda, te segura, até que a outra perna venha em salvamento e completamos o passo. Tem que tomar cuidado, não forçar o joelho, a coluna. Quando tem um sol escaldante, então, melhor ainda. Estava eu assim hoje, caminhando na praia. Afundando pé ante pé, tentando me equilibrar, imaginando como as duplas de vôlei de praia sobrevivem.
Quando, de repente, pisei em uma pegada anterior. Era mais fácil assim. Alguém já tinha passado por ali, afofado aquela areia, se desequilibrado, talvez caído. E deixou seu rastro. Que poderia ou não ser seguido, aproveitado. Tentei, e gostei. Era quase como se fosse plano, andando assim, na pegada do outro.
Como na vida. Algum amigo, amor, família já passou por algo muito semelhante que nós, certamente. Talvez ouvindo mais, compartilhando mais essas experiências nossa caminhada fique mais leve, como meu caminhar hoje em cima de pegadas desconhecidas. Quem sabe? Um caminho já percorrido, uma dor já sentida, uma lágrima já vertida, será que aliviam nosso caminho? Talvez. Na areia funcionou.
Segui ali, firme, olhando atentamente para o chão e buscando a mesma trilha. Vez ou outra, ela sumia. Eu afundava e de novo me aprumava. Era divertido. Como na vida. Cair, levantar, desequilibrar, tentar de novo.
Mas compartilhar dá trabalho, dói também. Só mesmo tentando, se permitindo, recebendo e dando, quem sabe?
Fui até a ponta da praia. E comecei a voltar. Surpresa! Desta vez tinha minhas próprias pegadas para seguir, meu próprio caminho. Meu pé cabia, claro, perfeitamente naquela pegada, era minha. Como na vida. Momentos em que você se apropria tanto do seu caminhar que parece levitar, quase voar. Sabe as esquinas, as lombadas, as curvas, o momento de parar para abastecer. Um sentimento de conforto toma conta.
Mas o mar vem. E apaga as pegadas. Minhas e dos outros. A areia fica de novo lisa, pronta para ser pisada, afofada. A agasalhar novos e segundos passos. É preciso de novo recomeçar, deixar novas pegadas na areia.
Talvez não no mesmo ritmo das marés, mas a vida vai e vem.
Como as ondas que apagam as pegadas.
Mas que trazem as conchas que nos fazem sonhar.
Quem sabe até uma ostra, quem sabe uma pérola. Tudo está lá, o mar, a onda, a areia, a concha, a ostra, a pérola. Somos nós que escrevemos a ordem das coisas, o enredo da história. Às vezes mais inspirados, por outras quase repetindo uma trama já lida.
Se seremos os primeiros a pisar na areia fofa, se pisaremos em cima de uma trilha anônima ou se teremos a segurança de pisar em nossos próprios passos é impossível prever. Mas uma coisa é certa: o prazer do exercício é garantido.
Pra você, Ro - 21/5/2014
“’Tumate’, alface e mamão você come em casa”. Essa era a Ro, na sua essência. Carioca da gema, era inconcebível para ela que pedíssemos em um jantar no restaurante uma frugal saladinha e fruta de sobremesa. Ela tinha razão. No dia em que soube de sua partida, ganhei um brigadeiro que veio com a seguinte frase: “A vida é muito curta. Comece pela sobremesa”. A Ro tinha razão. Ela sabia saborear uma sobremesa, uma amizade, um momento em família. Eterna inconformada com o jeito frio dos paulistanos, aqui ficou. Va lá, se estabeleceu entre Pinheiros e Vila Madalena, quase Rio. Tinha um quê antigo de quem preserva as amizades. Gostava de estar junto, se revoltava quando a gente não conseguia se ver. Foi minha primeira editora, lá nos idos da Revista Máxima, eu ainda solteira. Ro foi no meu casamento. E era claro o quanto ela estava feliz ali. Ela degustava a vida em todos os seus goles. Não deixava nada pra sobremesa. Ela acreditou em mim. Me tirou de um emprego seguro em uma agência pra ser free lancer na Editora Abril. Foi com ela minha primeira matéria publicada, lembro bem, sobre bicicletas. Ro escrevia como poucas. Eu tentava ser como ela. No texto e na vida. Mas não sou tão boa. No texto e na vida. Ela era leve, como um fim de tarde em algum posto de uma praia carioca. Ela era alegre, como se sempre estivesse com uma água de coco e amigos em volta. Ela tinha razão. Mas ela se foi. De repente. Sem aviso, sem dizer que sofria, sem compartilhar seus últimos momentos neste planeta. Ela se foi, de repente, para dor, surpresa e medo de todos nós. Por que, Ro? Por que não dizer que tinha câncer, por que guardar, por quê? Perguntas em vão, que se foram com ela, jornalista de mão cheia, amiga, mãe, carioca. Este texto não tem parágrafo, vai direto do começo ao fim, como foi sua vida. Sem paradas, sem breaks, sem espaço para lamentações. Ro, você certamente editaria muito este meu texto, deve ter muita palavra repetida, poderia ser bem melhor. Mas é isso que meu coração doído e apertado hoje consegue colocar pra fora. Dizem que os bons vão mais cedo. Não tenho dúvida. Você se foi. Com todos os sentimentos vividos, todas as dores sentidas, todas as frustrações e alegrias vivenciadas. Você não deixava pra depois. Comia com gosto a sobremesa como se soubesse que sua vida seria curta. Mas intensa. Real. Forte. Como você, Rosana Faria de Freitas. Amiga, mestre, querida. Sempre. A cada sobremesa que eu comer, com gosto, lembrarei de você. Porque tomate, alface e mamão a gente come em casa. Você tinha razão.
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